23 junho 2011

SUMIKOMI, O Céu no Inferno


SUMIKOMI. Um dos tradicionais modo de vida profissional está morrendo no Japão. Trata-se de “morar” no local de trabalho. Era bastante comum, os proprietários de restaurantes construírem o estabelecimento juntos da suas moradias. Em muitos casos, ou a parte dos fundos ou o piso superior era a residência. E um dos cômodos, serviam de alojamento para os empregados. Nas antigas, músicos, cantores, dançarinos, comediantes, atletas de sumô e itamaes (Chef de Cozinha Japonesa), dividiam o mesmo teto. Dividiam a “mesma panela de arroz”, como dizem os antigos.

O fato de morar junto com colegas de trabalho, parece muito desvantajoso. Falta de privacidade, do seu cantinho e sua vida muito exposta. Mas acreditavam que para vestir a camisa da profissão, primeiro deve-se enfrentar o maior dos problemas. A falta de introsamento entre a equipe.

Muitos de outras culturas, podemos achar um exagero. Mas os japoneses dizem que, para aprender um ofício, não basta ser apenas no local de trabalho. Pode, através de um bate papo, surgir a luz do fim do túnel. Os profissionais japoneses e principalmente nas áreas tradicionais, parecem ter duas personalidades. Uma dentro do local de trabalho e outra fora. Um Itamae, pode ser duro e rigoroso com a equipe dentro da cozinha. Um passo fora, pode ser bastante flexível. E é nessa fase flexível, que pode-se obter o máximo de dicas. Mas para isso tem o preço. Se tem uma coisa que existe, dentro e fora do trabalho, é a hierarquia. O mais novo é o que mais sofre. Acorda mais cedo, para servir chá aos superiores que acordam depois, saem a noite, na chuva para comprar cigarro ou sake, entre outras coisas, isso sem falar na limpeza, arrumação e lavar roupas.

Em 1991, para me preparar para o Campeonato Mundial de Kendô, participei de longas “Concentrações”. A média de idade dos lutadores era de 25 anos. E só eu com 16. Era o inferno sem ter morrido. Tanto que me apelidaram de escravo. Desde às 5:30 da manhã, até 23:00, com 6 treinos puxadíssimos, me massacravam durante os treinos, e nos intervalos, a mesma coisa. Estender os encharcados quimonos, preparar equipamentos, arrumar o dormitório, ajudar na cozinha, e sempre gritando “HAI!!”. Muitos com o tempo de convívio, amoleciam. Mas tinha um que bastava me olhar que inventava um ordem. Durante o treino, eram cotoveladas e rasteiras, que não eram permitidas. Mas os técnicos ignoravam. Mesmo chorando escondido, suportava qualquer absurdo, pois tinha um objetivo. Fortalecer o meu caráter!!

Mais um dia de treino, quando o técnico decidiu fazer um simulado do campeonato, meu primeiro adversário, adivinha quem? Minha Nossa Senhora!! Mas não sei o meu dia estava bom, consegui vencer a luta, o que rendeu bons berros do técnico ao veterano. Mesmo depois da luta, fui até ele e agradeci e pedi desculpas. E também foi a primeira vez que me chamou pelo nome, ao invés de escravo. O saldo do simulado foi ótimo para mim, péssimo para o restante. Fiquei em 3º lugar. O técnico reuniu todo mundo, me elogiou e descascou o resto. Na minha mente, não parava de pairar a frase: TÔ FERRADO!!! O técnico bufava dizendo: “AINDA BEM QUE FOI UM SIMULADO, SEUS INCOMPETENTES!!! GRADUADOS PERDENDO PARA UM MOLEQUE DO JUVENIL!!!!”

No dia seguinte, acordei cedo e preparava o café, quando o pessoal entrou no refeitório. E todos me chamaram pelo nome e me deram bom dia. A minha vida continuou a mesmo até partirmos para o Canadá. Mas ganhei muitas dicas de golpes que me rendeu o título de Campeão Mundial, na categoria juvenil DE 1991. Sou muito grato aos meus veteranos.

Mas sou mais grato ainda, pela oportunidade que surgiu de participar de dolorosas concentrações.