04 agosto 2012

Arte da Guerra




Hoje, vejo meninos e meninas de 13 à 17 anos, se esfregando, engravidando e fazendo coisas que não tem mais volta. Um exemplo são as drogas ou no mínimo o consumo inconsciente de bebida alcoólica e o tabaco. Não saberia o que pensar, quando os meus filhos chegarem nessa idade. Muita conversa, muita cumplicidade e disciplina, seriam a chave para colocar essa molecada nos trilhos, porém falhamos.
Mas também, vejo jovens nessa mesma idade que se despertam para desejar tomar um rumo dígno. Não para mostrar dignidade aos outros ou para os familiares. Mas para si mesmo.
Eis que no dia de hoje, uma correria infernal, cliente atrás de cliente, ou enquanto aproveito que o movimento recua um pouco para comer algo, dois meninos vem me visitar, sendo que um deles é filho de uma amiga jornalista no qual temos um elo no ramo da gastronomia.
Veio e me apresentou um amigo, que estuda na mesma sala de aula e que ambos entraram na academia de Kenjutsu. Quem comanda as várias unidades da arte no Brasil, também foi e é meu mestre de Kendô, meu grande mentor para a conquista do Campeonato Mundial de 91 em Toronto, no Canada.
Com os olhos quase pulando de seus rostos empolgados, ouviam cada palavra que eu falava, sobre a experiência que foi suportar e honrar a dolorosa caminhada da arte marcial. Muitos que hoje praticam qualquer modalidade, honram não só a parte técnica e física, mas a espiritual, controle emocional e a formação de caráter.
Praticando desde os meus 9 anos de idade, e morando num prédio onde vivam várias crianças, toda quinta-feira às 18:30 era o terror, Descia o elevador e quando parava no térreo, via muito dos meus amigos brincando. Pensava: “Por que tenho de treinar enquanto todos estão brincando?”. 
E para piorar, durante os treinos, era gritaria dos mestres, dos meus superiores, exercícios exaustivos, um completo curso do BOPE, só que com vários Capitães Nascimento!! Mas olhava ao redor e via meus companheiros na mesma situação:
“Não sou o único que estou sofrendo.”
Pensava comigo mesmo. Então passei a me empenhar bastante e ao conquistar o SHODAN ou a faixa preta com 14 anos, senti que valeu muito a pena. Vieram vários torneios  e me classificando, até chegar ao auge, o Mundial. Mas o peso da importância da arte ficou mais forte, quando comecei a trabalhar e ao virar pai. 
Me lembro, quando os mestres e veteranos falavam: “Nunca olhe apenas para cima. Olhe também para baixo.” Esse ensinamento era para se tornar um bom líder. Sempre olhar para frente, mas nunca esquecer que tem pessoas precisando de sua ajuda. Quando você é novo, precisa ter alguém para se espelhar, uma posição, um objetivo. Porém com o passar do tempo, precisa também notar, que há pessoas atrás de você, mais nova, te espelhando. 
Com vários ensinamentos que obtive no Kendô, me dei muito bem em trabalhar em várias empresas, chefiando e sendo chefiado, hoje proprietário e pai. Posso dizer, que todo aquele inferno que passei, justo ou injustamente, valeu muito, mas muito a pena. 
Vai um recado para os pais. A arte marcial, como o nome diz: “Arte para a Guerra”, é semelhante ao regime militar. Seus filhos vão enfrentar vários obstáculos surreais. Vão gritar com eles, vão bater neles, vão humilhar até dar dó. Porém a diferença entre uma academia de arte marcial e vida real, é que o primeiro, são simulações e exercícios, e se errar, são perdoados.
Nenhum pai ou mãe, gosta de ver seu filho sofrer. Mas garanto que faria tudo de novo e hoje como pai, jogaria meus filhos aos lobos, para que voltem com a matilha.


08 julho 2012

Curtas Histórias 1


O “Alhos e Passas” (não sei o nome dele) do blog Alhos, Passas & Maçã http://alhosepassas.wordpress.com/ me deu a idéia de fazer uma seleção de curtas histórias sobre o que acontecem aqui na Adega de Sake. Para quem não acompanha o meu twitter (@OAdegaDeSake), pode estranhar e até achar que é inventada. Mas muitos presenciaram cenas,que são engraçadas contando agora, mas na hora era de arrancar os meus cabelos. Então vamos ler algumas.
Posso comer aqui?

Na Adega de Sake, nossos principais produtos são os Sakes e Shochus, mas fazemos alguns pratos e disponibilizamos no balcão, já que éramos um bentoyá (marmitas japonesas). 
Eis que entra um rapaz estampando uma cara de estudante e com a sua mochila, olha os sakes, shochus, alguns pratos de sushis e repara nas duas mesas que oferecemos para o clientes. Daí ele:

- Ah, pode comer aqui?”
- Pode sim. - Respondo

Ele se acomoda em uma das mesas, coloca na outra a sua mochila e de dentro, tira um saquinho com uma coxinha fria, um suco de frutas de caixinha e se delicia apreciando as várias garrafas coloridas da loja.
Então, né?

Tem cocô?

Essa é uma das histórias que contando agora é engraçado, mas na hora quis morrer, graças ao meu filho que tinha 3 anos na época, me fez passar por uma situação tão constrangedora que fiquei da cor do Shochu Kaido.
Na noite anterior depois do jantar em casa, ao ver meu filho de 3 brincando com seu irmão de 7, reparei na enorme barriga. Daí disse:

- Nossa que barrigão!!! Deve ter um monte de cocô aí dentro. Vamos lá ao banheiro. - e levei. Essa idade, nós como pais temos que antever as coisas, senão do nada quer ir ao banheiro.

No dia seguinte, aqui na Adega de Sake, meu filhote voltou da escola e viu um casal de senhores de idade expondo um abdômem generoso. E ele chegou bem de perto e acariciando a barriga do senhor, olhou para cima e com a cara séria:

- Tem cocô?

Senti o piso da loja desmoronar debaixo dos meus pés. Aliás era exatamente isso que desejei, para me esconder. Mas o simpático casal caiu na gargalhada e adorou o comentário, visto que eles tem 7 netinhos. 
Desconfiança

A coisa mais triste para um vendedor é não se confiado. Isso quando uma senhora entrou na loja  perguntando se eu vendia shoyu, o molho de soja. Disse que não, daí:

- Aquela garrafa lá escura. Não é shoyu???
- É sake senhora.
- Mas daquele tamanho? Deve ter uns 5 litros!
- É uma garrafa de 1800ml de sakes. Bastante comum.

A melhor parte:

- MAS TEM CERTEZA QUE NÃO É SHOYU?
Senhora, sou consultor de sake. Não poderia confundir uma coisa dessa.

E mesmo assim, ela pegou a garrafa para ver. E como a garrafa é escura não soube diferenciar.
Roupa de Ninja

Mas o melhor (ou pior) de todos foi quando já estávamos fechando a loja, entra um rapaz e:

- Vocês vendem roupas de ninja?
- Senhor?
- Roupas de Ninja.

Normalmente para não criar um certo atrito, logo respondo que não é pronto. Mas é cada pergunta que vem e resolvi prosseguir um pouco.

- Não senhor. Mas queria saber, o que te fez perguntar se vende roupas de ninja, já que na entrada está escrito Adega de Sake?
- Achava que nas lojas da Liberdade vendiam.

Respondi que não educadamente, embora a minha vontade era outra. 

Lógico que tem várias outras histórias ainda mais absurdas, como também tive momentos de muita emoção e reflexão que contarei no próximo post.
Lembrando que diferente da linguagem do twitter e do facebook (que eu falo palavrão pra kct), todos os clientes são tratados de forma digna, com muito respeito e educação, apesar querer dar na cara!!

30 junho 2012

Remanso & Reflexão

 Felipe e Thiago Castanho do Remanso do Bosque e Remanso do Peixe

Há oito anos atrás, projetei um trabalho que hoje é o meu principal. O estudo dos Sakes. No intuito de preservar a cultura de uma bebida, que tem ramificações em várias partes da história, mitologia, eventos festivos e alguns tristes do Japão.
 
Não sou um entendedor nato de bebidas alcoólicas, mas 24 horas por dia penso nesta riqueza. Dia após dia, fui provando os mais variados rótulos de sakes para sentir o seu aroma e sabor, fiz anotações técnicas ao meu modo e consegui ter uma noção de como elas são. Mas ao mesmo tempo que estudo a bebida, também comercializo. Ou seja, estudo na teoria e sinto na prática. Como os consumidores reagem, quais as suas dificuldades de compreender, o que elas buscam.
Dessa forma, ao longo desse tempo, criei a minha maneira de abordar os clientes o que não funcionaria em outro lugar ou outra pessoa. Isso tudo me rendeu um certo prestígio e reconhecimento o que tornou o meu trabalho em uma grande responsabilidade. O que era apenas um projeto para trilhar o caminho correto da bebida no Brasil, acabei criando o trem e suas composições.
 
Esse trem acabou de romper as fronteiras do meu comercio, e passei a visitar vários lugares a fim de levar a minha “receita” para transmitir a cultura do sake. Fui convidado para dar aulas em uma renomada associação que forma sommeliers no país, treinamento de brigada em restaurantes e escrever colunas sobre a bebida para instituições no Japão.
Mas a cada desafio que é colocado na minha frente, coloco a minha mente na estaca zero. Ou voluntariamente ou involuntário. 
 
Recentemente fui convidado a dar uma palestra no Restaurante Remanso do Bosque em Belém/PA dos irmãos Thiago e Felipe Castanho num jantar harmonizado. Duas figuras muito queridas na gastronomia brasileira, que usam os ingredientes amazônicos para agradar todos os gostos. Tanto as pessoas que vivem na região ou recém chegados. Com sabores muito particulares, mas que conseguem dar uma pitada de suavidade, o que encantou e muito a grande colônia japonesa na cidade.
 
Quando Thiago ligou me convidando, aceitei na hora. Já o “conhecia” pelas mídias sociais e uma tremenda reputação contadas por seus colegas cozinheiros. Inclusive pelo Itamae, Shin Koike do Restaurante Aizomê em São Paulo. Apesar de muito simpático, sei que não é de elogiar muito as pessoas. Um carinho e dedicação que Thiago tem pelos ingredientes, foi o que mexeu com o chef nipônico. 
 
Então me senti honrado em ser chamado por um profissional de calibre, uma pessoa como eu, que apenas tenho o conhecimento da bebida. Sei e estudo as combinações do sake com a comida, mas não cozinho. Sei de ponta à ponta sobre a fabricação da bebida, mas nunca produzi sake. E de repente vem esse chamado, seria uma desfeita em não participar.
 
Com muita honra e respeito, parti para Belém e o desejo de o quanto antes conhecer esses irmãos. E desde a minha chegada até a partida, um tsunami de simpatia e gentoleza dada à mim, que chego a me emocionar. Mas também ganhei uma pesadíssima lição. NÃO SEI NADA DE PEIXES. Pude experimentar os saborosos pratos do Remanso do Pexie, o ponto de partida de todo o trabalho da família Castanho.
 
Novamente estava na estaca zero. Tenho que reaprender e muito os diversos sabores escondidos nesse país, que muitas vezes, não valorizados por nós.
 
Um dos principais objetivos do Remanso do Bosque, é o projeto VISITA GOURMET, onde a cada mês é convidado um chef de renome para mesclar as técnicas usando ingredientes da região.
E na ocasião que fui convidado, dividi a semana com o chef Sergio Tsutsui do Restaurante Hakata em Belém e Shin Koike do Aizomê, de São Paulo, para promover a homenagem à colônia japonesa na cidade, apoiado por precisos patrocinadores e o Consulado Geral do Japão.
 
Definitivamente foram emoções fortes. Mesmo depois de ter passado alguns dias do meu retorno, somente hoje, consegui refletir tudo e colocar nesse post.
 
Meu desejo é que todos os cozinheiros de diversas regiões, possam fazer esse tipos de intercâmbio. Que todos os profissionais de vários setores da gastronomia, possam compartilhar informações e técnicas.
 
Vida longa aos irmãos Thiago e Felipe Castanho e sua belíssima família!!


15 maio 2012

SLOW DRINK




Muitos conhecem apenas um lado da moeda, quando se trata de bebida alcoólica. O ruim. Pessoas embriagadas dirigindo, agredindo e a coisa evolui e acaba cometendo homicídio. seja doloso ou culposo. O estrago é o mesmo.
Isso no mundo todo e desde tempos remotos. Em muitos países, no passado e nos dias de hoje, aplicam a Lei Seca. Mas como proibir um vício? Sabemos que qualquer coisa que proibimos, vão achar um jeito de consumir, o que aconteceu na década de 20 nos EUA. Proibiu, a máfia aproveitou e a coisa simplesmente piorou mais do que já estava. 
E jovens que começam a beber sem saber o que é. Não sabem apreciar a bebida. Apenas manter a pose e status. As pessoas dão mais crédito para aquelas que bebem. Se acham os bons, as maduras e tal. Mas é uma ilusão bastante errônea, que os responsáveis pelos filhos, não orientaram. Simplesmente proibem. E sabe que se proibir um jovem, aí que ele corre atrás. Então por que não educamos? 
Lembro que meus pais, diziam quando o assunto era bebida, fumo, drogas e sexo. Me passaram todo o perfil de cada um. O prazer e a consequência. E que na minha maioridade seria livre para escolher. Se eu ansiava em saber antes, falavam para ter um pouco mais de paciência, mas jamais me proibiram, exceto as drogas que não tem mais volta.
Quando completei 18 anos, não tive muita vontade pegar o carro e nem fazer uma expedição em cinemas para adultos na Rua Aurora, na Praça da República. Meu desejo acalmou. Ou seja, quando somos jovens é apenas impulso e não por gostar disso. E a sociedade nos empurra sem qualquer cuidado. Campanha, marketing e propaganda, não basta apenas vender. É ensinar a consumir para consumir sempre.
Do que adianta, vender agora, e não conseguir amanhã? Se as pessoas aprenderem a apreciar, saborear e curtir, pode não vender kilolitros hoje. Mas será vendido eternamente.
Para isso, fica aqui a minha sugestão do SLOW DRINK. Coisa que eu percebi vendendo sake, ensinando, transmitindo todo o conhecimento sobre a bebida com muito mais tempo e paciência. Antes as pessoas conheciam sake pela sakerinha. Quando ensinado de forma correta, esses mesmos consumidores repudiavam o drink. Não condeno o coquetel, mas que antes saibam como é feito, quais técnicas, como é preparado, para depois consumir do jeito que desejar.
Uma coisa é certa. Hoje temos vários cursos sobre várias bebidas. Mas será que oferecemos informações suficientes? Informação para os leigos que não conhecem muito a bebida? Dá a impressão, de que você tem que estudar antes para fazer um curso, senão as pessoas em volta, vão te olhar como estranho. E eu que não sei escolher um vinho? Não sei tomar uísque corretamente. Não sei como se compra um conhaque. E assim vai.
Assim como uma fermentação lenta que proporciona uma belíssima bebida, por que não usarmos essa técnica para também ensinar o público? Ensinar os jovens como se deve beber? As suas consequências. Seus riscos e seus prazeres, se consumido adequadamente.
Eu acho que vale muito a pena. Que percamos o rítmo agora, para manter o mesmo por muito anos. Quem sabe acabemos de médio à longo prazo, o consumo excessivo e descontrolado, em consequência os acidentes de trânsito e a violência.
Não adianta baixar uma lei proibindo tudo, multando o comerciante ou restaurante!! Vamos educar. Muitos querem informação mas tem vergonha de perguntar. Qual é o jovem que chega para o amigo e: “Pô, eu não sei tomar uma cerveja. Você me ensina?” Seria um mico muito grande.
O que vocês acham? Estão educando os seus filhos ou proibindo sem mais nem menos? E não adianta ensinar do seu jeito. É ensinar do jeito que os jovens entendam.

09 maio 2012

O Vovô


De papo no twitter com a Soraya de Castro (@soraya_castro) e o Sandro Um Litro De Letras (@umlitrodeletras), lembrei de uma história que aconteceu comigo. Vamos lá.
Sabe aquele final do expediente, em que sua bunda formiga querendo ir embora? Então, um belo dia, nos tempos que trabalhava no Aeroporto de Guarulhos e na Varig, olhei o relógio e faltavam menos de 25 minutos para me livrar da minha mesa, da minha sala, do meu informe. Daí a “Lady Murphy” viu minha empolgação e resolveu cortar o meu barato.
Pelo rádio, fui acionado para acompanhar um senhor japonês que me aguardava na Sala de Atendimento Especial. Dentro de mim eu dizia: “Cês tão de sacanagem!!” Mas fazer o que? Quem mandou criar um grupo de atendimento de passageiros japoneses na empresa? 
E lá fui saltitando de alegria, só que ao contrário, atravessando o saguão deserto do Terminal 2 do aeroporto. E antes de entrar na sala, tive de passar por grupo de uns 8 engravatados do Men in Black para avistar um senhor quase careca de óculos, sorrindo para o nada com uma camisa de cantina italiana.
Me sentei ao lado dele e: - Boa noite? Como estamos? (Totalmente inadequado pelo estilo Varig de atender). Mas estava sonhando em ir embora, mas acordei para o pesadelo.
Conversamos um pouquinho e disse: “Vambora vovô, se não o avião sai e eu tenho de ficar com o senhor.”
Peguei a mala dele e 6 passos depois, ele tinha avançado 3. Pensei: “Ai minha nossa senhora.” Resolvi (contra a vontade) acompanhar os passos em slow motion. Essa altura, quem está lendo, deve achar que sou um monstro, mas tem dias que no primeiro minuto que você chega para trabalhar, você pensa: “Faltam 7 horas e 59 minutos para ir embora.” Então me deixe!!
Com bastante esforço, chegamos na “Imigração”. Cadê a porra da Tarjeta de Saída? Peguei todas as coisas do mão dele e nada. Tive de preencher tudo. Um saco.
Nossa caminhada parecia um jogo de ultrapassar obstáculos. Aí veio o raio-x onde tivemos de voltar umas 4 vezes. Quase que deixei o velhinho pelado. Daí escuto no rádio.
“Olha só falta o passageiro que você tá acompanhando.” Eu “Pelo amor de deus. Não vai soltar o vôo antes de chegar!!!!” disse calmamente (até parece).
E aquele longo corredor que nos leva ao portão 23, parecia uma eternidade. E o senhor queria que queria puxar papo. Conversamos de tudo e um pouco. Disse que praticava artes marciais, que gostava de desenhar, disso daquilo e que amava conversar com idosos, menos naquele dia.
Enfim, 15 anos se passaram, chegamos no portão. Eu já com todos os documentos nas minhas mãos, destaquei o seu cartão de embarque: “1A”. Puxa, primeira classe. E ainda fui debochar: “O vovô tá bem hein? Deve ter um filho cheio da grana, né? Que legal.” Ele sorrindo o tempo todo, nem sei se ficou contente ou não com o que eu disse. Mas tudo bem. 
Ainda tinha um “finger” para descer, mas ainda bem que é uma descida. Doce ilusão. Nas descidas, eles tem mais medo e retardam a velocidade, o que tive de segurar a mão dele. A minha vontade era de o carregar no colo. 
Em dias normais, eu deveria ser bem mais amável com passageiros mais necessitados. Mas sabe aquele dia que você não deveria ter sonhado em acordar? Então.
Chegamos na porta 2 do Boeing 747-300 e a Chefe de Cabine nos aguardava. Fui até a poltrona dele, fiz ele sentar, devolvi todos os documentos e até afivelei o cinto dele, não sou um amor? Me despedi falando: “Boa viagem, hein vovô. Se precisar fazer xixi, é só apertar esse botão aqui, que alguém vem te buscar, tá?”
E ele: “Nunca fui tão bem tratado numa companhia aérea. Quero que fique com o meu cartão. Quando vier para o Japão, venha na minha casa.”
Eu com o pensamento: “Tá, tá.” e peguei o cartão e li...
“PRESIDENTE MUNDIAL DA HONDA”
...todo o cenário congelou. Um silêncio e podia ouvir apenas o batimento do meu futuro-ex-coração. Sem poder pensar em nada, eu cai de joelhos na frente dele. Não que eu quisesse, mas aconteceu. E em milésimos de segundos, todo o meu cérebro começou a procurar todos os termos altamente formais em japonês, para tentar consertar o que fiz até agora.
“Mil perdões, senhor. Mil perdões. Confesso que não estava num dia bom e sei que não há desculpas!!” e pensando naquela cartinha de cor parda, temida por todos os funcionários. A carta de demissão.
Mas ele, se curvou para frente e: “Levante o seu rosto...”(Não conseguia olhar na cara dele) “...você me atendeu de forma humana. Meus filhos, meus netos, falavam assim comigo, quando pequenos. Mas hoje, mesmo em ambiente privativo, me chamam de senhor-presidente. Sinto falta que me tratem como gente. Esses 8 rapazes que estão comigo, são da minha comitiva...” (eu sabia, seus MIBs do cacete!! Podiam ter me alertado, né?)
“...todos me tratam pelo meu cargo. A companhia aérea japonesa que sempre voei, me reconhecem em qualquer vôo, e me tratam pelo cargo. Sou humano e esse tipo de comportamento cansa demais. Mas você não se importou com o que sou...”(Eu não sabia) “...e pude matar a saudade, mesmo que por alguns minutos, o prazer de conversar com alguém, sem rótulos.”
Bom enfim, depois disso, fiquei sabendo que a empresa dele, fechou um contrato firme com a  Varig e qualquer membro de sua comitiva e o alto escalão da Honda, passariam a voar conosco. 
(Não recebi um tostão e quase tomei advertência, mas tudo bem)
Pessoas importantes, podem estar bem do nosso lado. Não veja pela roupa, nem pelo que ele conta (ou não conta). Trate qualquer ser humano, como se fosse da família. Não façam o que eu fiz. Tive sorte, mas poderia ter dado muito errado.
....porra, chamei o presidente da Honda de “vovô”...




02 maio 2012

Por um Mundo mais Meio Termo


Já repararam que o mundo está mais estressado a cada dia? Que novidade, né? Os vários mercados em correria, não existe mais dia, noite, folga, feriado ou férias. Todos correm, só não se sabe para onde. Ninguém sabe porque, mas correm. Ou vê o outro correndo e começa a desesperar. 
Eu peguei um dia e observar bem atentamente. Através da mídia social, passeio ao parque, shopping, programas de tv como futebol e até canal religioso. Tudo isso em um dia. Ufa!!
Você percebe num jogo de futebol, as pessoas torcem para os seus times com muito mais garra e força, às vezes muito mais energia que os jogadores. Vejo pessoas que crêem nas suas religiões, trazendo paz e harmonia para si e à família. Pessoas andando no shopping a procura de seus sonhos materiais e diversão. No parque, muitos se exercitando para manter a forma, respirar o pouco ar puro de São Paulo e se sentir saudável. Nas mídias sociais, leio artigos e posts interessantes que levaria tempo para peneirar em sites de buscas. Comentários engraçados e divertidos que podem render o nosso dia.
Se parasse aqui, na minha visão, o mundo estaria muito mais agradável. Acho. Mas muitos ou quase o mundo todo, quer mais. Todos extrapolam!! Querem competição. Querem ver quem ganha, que tem mais, quem pode mais. Não bastando isso, partem para a ignorância física ou psicológica. Ninguém escapa.
De novo. No futebol, todos com ânimos exaltados, quem ganha provoca quem perde. O fracassado, revida e começa a pauleira dentro do estádio e se estende para fora, envolvendo pessoas que não tem nada a ver. No shopping, o desfile de sacolas de compras com o rosto parecendo dizer. “Eu posso. Vocês não, seus pobres!!” Nos corredores do shopping, também o mesmo desfile para ver quem se veste melhor. Na praça de alimentação, quem pega mais mulher ou homem.
No parque, quem está mais malhado ou gostosa. Quem tem corpo bonito, acha que gordinhos não deveriam vir ao parque. Na religião, a competição de quem doa mais para a igreja e mostrar os seus milagres. Entre igrejas ou religiões, ofensa para tudo que é lado. E isso não é só entre religioso. Os ateus também entram nessa briga. 
Nas mídias sociais, é a disputa para ver quem tem mais amigos, quem tem mais contato, quem é mais famoso, se um artista falou com a pessoa, quem frequenta ou viaja para lugares sofisticados e exóticos. 
Diante de tudo isso surgiu uma pergunta. PARA QUE TUDO ISSO? Já não basta os problemas que naturalmente aparecem? Não basta fazer o que você tem vontade e deixar os outros em paz? Não sabem que, se você pentelha uma pessoa, lhe dá o direito de ser pentelhado? 
Eu acho assim. Que cada um que faça a sua parte, trate bem do seu bichinho, cuide de sua família, acredite na sua igreja ou não acredite. Pratique esporte para você se sentir saudável. Compre roupas, para você se sentir bem. Torça para o seu time e deixe o outro em paz. Mas deixem os outros em paz!!
Tudo em excesso faz mal para nós. Até nos alimentos. Precisamos de açúcar, sal, proteínas, carboidratos, ferro, e tal. Mas em excesso até o consumo de água se torna perigoso, diluindo o sódio do nosso corpo.
Exemplo: No meu caso, não torço para nenhum time de futebol, o que já me chamam de bicha. Só que assisto futebol. Mas não torço. Não saio muito de casa, porque paguei uma fortuna para estar bem dentro do meu lar. Mas me chamam de careta. Não costumo sair para jantar, já que eu mesmo cozinho, o que me chama de anti-social. Vou ao shopping e fico horas na livraria, o que me chamam de culto, mas não leio muito. Fico no twitter e reclamo bastante do governo, das injustiças da vida e chamam de estressado. Só que escrevo coisas engraçadas e úteis também. Não sigo nenhuma religião e querem me jogar no inferno. Mas não sabem que respeito todos. Quando tenho de entrar em qualquer igreja, me adentro com bastante respeito e humildade. 
Não sei porque as pessoas tem esse furor de rotular os outros.
Então a conclusão que me chega é: Torço POR UM MUNDO MAIS MEIO TERMO. Ultrapasse de vez em quando pela faixa da esquerda. Reduza um pouco na faixa da direita. Mas mantenha sempre na faixa do meio. E deixem os outros motoristas em paz. Não buzine!! 
O que vocês acham?


29 abril 2012

O mais importante, é por acaso.


(Cena do filme - O Terminal, com Tom Hanks e Catherine Zeta-Jones)


De papo com a Helena Gasparetto, Dani Cascaes e Célia Regina, nasceu esse post.
Apesar desse meu jeito bem brasileiro, falo o que penso e muitas vezes, não dou a mínima para o que os outros vão pensar, tenho raízes de uma rígida cultura, onde devemos pensar nos outros, antes de si mesmo. Talvez por ter essa boa mistura, eu seja bem moderado. Tem coisas que tolero que se um japonês olha, fica assustado. Partes também de ser tão chato que o brasileiro pensa, que eu exagero.
Pois bem. Sou filho único e convivendo a anos com brasileiros não-descendentes de japoneses, é natural que eu me relacione com garotas “brasileiras”. O que de certa forma, meus pais não ficavam tão satisfeitos. Meu pai, nem tanto. Mas minha mãe pegava no pé. Eu? Nem aí. Sou eu que vou namorar e casar. Para mim, não existe nacionalidade para isso. 
Trabalhava no Aeroporto Internacional de Guarulhos, vulgo Cumbica, na Varig. Eu no Controle de Despacho de Passageiros, setor que fazia o que bem entender com os vôos. Atrasava, mandava embora ou cancelava. E ela, no setor de Embarque. Horários quase sempre desencontrados. Eu, um palhaço, falo alto, gesticulo muito. Ela, quietinha, tímida e comportada. Duas personalidades opostas. 
Enquanto com as outras quando cumprimentava, era abraço, beijo, quase um amasso. Com ela, um oi de longe. Com o tempo, já trocávamos......xingamentos e deboche. Chegávamos a conversar como se brigássemos a ponto de preocupar as pessoas em volta. Era bem divertido. Digamos que nos tornamos amigos. Mas só. Cadê a porta de “entrada”, para um pouco além da amizade? Se tinha chave? Não tinha nem maçaneta!! Ô menina difícil de conquistar. 
E o momento certo, foi quando ela foi acionada pela Polícia Federal, para contatar 3 passageiros chineses que tentavam sair do país para os EUA, com passaportes japoneses falsos. Minutos depois também fui acionado. Chegando na “Imigração”, me deparei com ela, falando com os chineses. Fui até eles e fiz perguntas simples como: “Onde você nasceu no Japão? Gostou de ficar no Brasil? O que mais gosta de fazer?”, tudo isso falando em japonês. Mesmo chamando pelo nome falso, eles não se manifestaram. Me virei para o Delegado e falei que não são japoneses e os passaportes eram falsos. De imediato, a PF deu voz de prisão e fomos todos nós para a sala da Delegacia da PF. E lá seguindo o protocolo de averiguação, contato com embaixada, consulado e o diabo. Nós? Eu e ela? Fazendo porcaria nenhuma. Nosso supervisor também estava conosco. Cerca de 5 horas para prestar um depoimento de alguns segundos. 
Mas foi ótima a oportunidade de digamos “Conversar”. E descobri o que ela sentia por mim, com o rosto mais vermelho que um tomate. E eu na hora de anotar o endereço dela para sairmos juntos, minha mão tremia demais. Também com uma caneta pesada que usava (olha a desculpa). Namoramos e casamos e temos dois diabinhos maravilhosos. 
Ah, e detalhe. Logo depois que começamos a namorar, a minha mãe adoeceu e partiu dessa vida. Mas ela se foi tendo a oportunidade de ver e conversar com a sua nora. Um amor recíproco e rápido. Faleceu sabendo que casei com uma “japonesa”. 
Moral da história. Nem tudo na vida, deve ser copiado de cenas românticas de novelas ou filmes. Nem tudo que se planeja dá certo. As maiores criações, invenções e acontecimentos, nasceram ocasionalmente. Basta estarmos atento a tudo em nossa volta e pararmos de se preocupar com a vida alheia.
E você? Está atento ao que acontece em sua volta? 



23 março 2012

Quem nasceu 1º, o Cliente ou o Sushi?



Na Folha Comida desta última quarta, criou-se uma certa polêmica com a coluna da Alexandra Forbes entre os Chefs de cozinha, por causa de um comentário dizendo sobre a falta de conhecimento do público brasileiro em relação aos ingredientes. Talvez não foi a intenção dela  ofender ninguém, mas soou de certa forma um pouco ríspida.  Bom até aí, eu sou pior ainda. Fazer o que? 
(veja aqui: http://boavidablog.blogspot.ca/)
O tema abordava a busca de renomados chefs no exterior, pelos ingredientes na fonte, seja na fazenda, no porto ou na horta. Não é uma nova tendência, pois os japoneses e chineses fazem isso à séculos lá. 
E em um dos comentários foi que, o brasileiro quando vai à um restaurante japonês só sabem pedir sushis ou sashimis de atum (vermelho) e salmão. Uma pura verdade. E senti também o desejo da colunista que mais restaurantes japoneses, oferecessem mais variedades de peixes do nosso litoral. Correto.
Também disse que passou dias na peixaria do Mercado Municipal aqui em São Paulo, e pode observar a logística do fornecimento do pescado para os restaurantes da cidade. Seu ex-parceiro era proprietário de restaurante e viu como é difícil obter mão-de-obra qualificada, espaço físico que muitas vezes não ajuda e a complicada armazenagem. Ninguém quer aumentar o espaço de sua cozinha e sacrificar o salão para atender clientes. Isso é fato. 
Concordo com toda essa visão até aqui da Alexandra. Porém, falando em restaurantes japoneses, não é todo peixe que se pode trabalhar, quando a questão é cru. Possível na teoria, inviável na operação. O porque, cada um diz uma coisa.
Analisando restaurantes japoneses só em São Paulo, existem desde rodízios baratos, as temakerias, os bentôs de sushis e sushi-yás de alto padrão. E cada um desses estabelecimentos, tem o seu foco de público diferenciado. Querem vender na quantidade, outros vender na variedade. 
Pois bem. Jamais em rodízios e temakerias, você pode arriscar em colocar peixes variados, uma vez que eles vendem o que o público quer. Culpa de quem? Não sei. Posso responder, quando alguém me disser quem nasceu primeiro: O Ovo ou a Galinha.
Para bentôs de sushis, as tradicionais marmitas, não tem como colocar peixes frágeis, uma vez que quem vende bentôs, tem que considerar que o cliente pode comer daqui à horas. Por isso, a variedade de peixes fica bastante restrito. Peixe branco nem pensar.
Sobram os restaurantes sofisticados. Mesmo entre os de alto padrão, dividem em dois tipos de público. Casas que japoneses mais frequentam e outras menos. Restaurantes que tem a sua maioria, os japoneses como clientes, alguns peixes ficam de fora, não sei por qual motivo. Salmão cru, não comem, pois consideram um peixe de água doce. Sacanagem!! Salmão nasce e morre em rios, mas passam quase toda a sua vida no mar. Mas fazer o que? Cavalinha e sardinha, só se tiver muito fresco. Há aqueles que não comem mesmo frescos, quando a mesa são ocupados de executivos japoneses de alta hierarquia, pois existe o preconceito com esse dois peixes. São peixes populares. Bobagem, mas fazer o que?
Robalo e Tainha, são peixes que diferente dos outros, não são tão sensíveis para a qualidade da água. Robalo por exemplo, podemos ver nadando nos canais do Porto de Santos, junto aos navios cuspindo óleo. (não que eu tenha mergulhado no canal).
Pescada, a carne quebra fácil e cheira mais quando cru. Carapau, se bastante firme. Linguado, tem que usar muito rápido, pois não dá para armazenar. Serra, é uma tristeza, quando não comprado quase vivo. Esse é o outro que fica desmanchado o tempo todo. Olhete, se firme e natural (não em cativeiro). Cavala, tem a carne muito dura o que se recomenda assar. Anchova, cheira. Por isso é melhor assado e consumido com solução de shoyu e gengibre. Enguia (Unagui) é importado e caro. Aliás os importados vem congelados e são mais caros, o que restaurantes medianos não conseguem vender.
Isso falando de restaurantes que atendem mais japoneses que ocidentais. Agora imagina quando o cliente não conhece bem? Vão pedir Torô (parte nobre do Atum), salmão, quem sabe um Pargo (meu favorito), que é um peixe cabeçudo, o que não sobra quase nada de carne. 
Tem também a questão operacional. Vamos supor que vamos limpar um salmão e um carapau. Salmão (número 2) é 10 vezes maior que um carapau. Mas na hora de limpar, o tempo é quase o mesmo. Só que um salmão rende muito mais que o outro.
Atum, já compram em peça, o que agiliza o trabalho. Quer dizer, muitos peixeiros para atrair mais o público, pegam por exemplo, a sardinha e já deixa limpo, sem escamas, vísceras, cabeça, prontinho para o uso. Daí junta o útil ao agradável e pronto.
Então há uma série de coisas que devem ser levadas em conta, antes de poder começar a variar os peixes. Podemos oferecer uma gama maior de variedades? Na teoria sim. Mas será que o público acompanha? Se eu como dono de restaurante, não importasse com o que o cliente deseja e oferecer o que eu quero, afastaria o povo que só quer salmão e atum. Teria de aumentar e bastante o preço e cobrar dos poucos que querem provar variedades.
Sushis de Ryouteis

Há muitos sushi-shokunins que fazem isso. Desde o Jun Sakamoto até o Hamatyo. Este último, o próprio dono pega o barco e vai pescar. Salmão? Nem tente pedir. No Mitsuyoshi, também. 
Mas só dá para contar nos dedos. Enquanto isso, só resta rezar para que mais pessoas ou casas, sirvam uma boa variedade de peixes. Ah e detalhe. Cada peixe tem épocas diferentes, o que muitas vezes indisponível no menu.
Para concluir, pensam que não sofro, quando tenho que vender sakes para a caipirinha? Para mim, a sakerinha é o temaki de salmão. Não estou condenando o drink, nem o sushi. Mas que mais pessoas, possam conhecer uma gama enorme de variedade para depois, quiser ficar na sakerinha, por mim, tudo bem.