04 abril 2010

O segredo está no Almoço

Todos nós sabemos que o mistério da metodologia japonesa, são sutis e ficam nas entrelinhas do cotidiano.

Pois bem. Quando estive em Kyoto, fui convidado para almoçar com a equipe de um restaurante tradicional de Fushimi. No local trabalham 17 pessoas e logo após do último cliente do almoço, vem a refeição do pessoal da casa. Na ponta da mesa, a proprietária, ao lado direito o Hanaita, e Máster Chef da casa. Quem prepara a comida são os novatos.

Fiz uma pergunta, que minutos depois fiquei bastante constrangido:

- Chef, os novatos preparam o almoço, por uma questão de hierarquia?

- Também. Mas não é só isso. Os itamaes, percorrem um longo caminho para poder servir um prato aos nossos preciosos clientes. Jamais permitimos que um novato prepare uma comida, sem a inspeção de um superior. O nosso maior chamativo é o nosso tempero. As pessoas nos visitam por causa o nosso sabor. Então mesmo que ele prepare 10 litros de um molho, mas quando um superior prove e não tenha mais como consertar, simplesmente descartamos tudo. Preferimos perder molhos ou ingredientes, que perder clientes. Aqui , não se usa nada industrializado.

Mas sei também, assim como eu quando fui novato, o sonho de preparar uma boa comida e ser reconhecido. Então o almoço é a prova. Durante a refeição, somos os clientes para eles. Desde o tempero, os cortes, o ponto de cozimento, a escolha dos recipientes, até a montagem, são avaliados. Todos os dias. É o único momento, que o novato tem a chance de receber críticas, ouvir conselhos e crescer. Eu digo que, não há palestra, treinamento e livros que possam instruir um cozinheiro. É a dedicação, paciência e a rotina. Isso que faz com que o cozinheiro se torne um excelente profissional. Se ele não tem perseverança, não há nenhuma outra profissão a seguir. A primeira coisa que pergunto a um candidato é: Você consegue se acostumar com a mesmice?

E isso não termina. Quando o almoço ficou pronto, todos os pratos eram impecáveis, digno de constar no cardápio. O conceito, a montagem, o equilíbrio de cores, estavam em perfeita harmonia. E o melhor. Todos com os ingredientes que sobraram na noite anterior. Ou com sobras mesmo! Casca de nabo e cenoura bem lavados, se transformam em um kimpirá apimentado. Uma delícia.

A proprietária olhou para mim e com o sorriso:

- Notei que percebeu o kimpirá.

- Está uma delícia, senhora. Nunca imaginei que podia preparar algo, com partes que costumamos jogar fora.

- Infelizmente nos acostumamos a uma vida farta. Os antigos, não desperdiçavam nada. Não só pelo fato de não ter muita comida, mas pela gratidão. Não basta apenas agradecer a Deus. Precisamos mostrar a Ele, na prática. Tiramos a vida dos peixes, carnes, aves e plantas. É uma falta de respeito jogar fora. O que pudermos usar, vamos usar.

Conclusão. Os segredos do sucesso profissional, estão bem mais perto do que imaginamos.