23 março 2012

Quem nasceu 1º, o Cliente ou o Sushi?



Na Folha Comida desta última quarta, criou-se uma certa polêmica com a coluna da Alexandra Forbes entre os Chefs de cozinha, por causa de um comentário dizendo sobre a falta de conhecimento do público brasileiro em relação aos ingredientes. Talvez não foi a intenção dela  ofender ninguém, mas soou de certa forma um pouco ríspida.  Bom até aí, eu sou pior ainda. Fazer o que? 
(veja aqui: http://boavidablog.blogspot.ca/)
O tema abordava a busca de renomados chefs no exterior, pelos ingredientes na fonte, seja na fazenda, no porto ou na horta. Não é uma nova tendência, pois os japoneses e chineses fazem isso à séculos lá. 
E em um dos comentários foi que, o brasileiro quando vai à um restaurante japonês só sabem pedir sushis ou sashimis de atum (vermelho) e salmão. Uma pura verdade. E senti também o desejo da colunista que mais restaurantes japoneses, oferecessem mais variedades de peixes do nosso litoral. Correto.
Também disse que passou dias na peixaria do Mercado Municipal aqui em São Paulo, e pode observar a logística do fornecimento do pescado para os restaurantes da cidade. Seu ex-parceiro era proprietário de restaurante e viu como é difícil obter mão-de-obra qualificada, espaço físico que muitas vezes não ajuda e a complicada armazenagem. Ninguém quer aumentar o espaço de sua cozinha e sacrificar o salão para atender clientes. Isso é fato. 
Concordo com toda essa visão até aqui da Alexandra. Porém, falando em restaurantes japoneses, não é todo peixe que se pode trabalhar, quando a questão é cru. Possível na teoria, inviável na operação. O porque, cada um diz uma coisa.
Analisando restaurantes japoneses só em São Paulo, existem desde rodízios baratos, as temakerias, os bentôs de sushis e sushi-yás de alto padrão. E cada um desses estabelecimentos, tem o seu foco de público diferenciado. Querem vender na quantidade, outros vender na variedade. 
Pois bem. Jamais em rodízios e temakerias, você pode arriscar em colocar peixes variados, uma vez que eles vendem o que o público quer. Culpa de quem? Não sei. Posso responder, quando alguém me disser quem nasceu primeiro: O Ovo ou a Galinha.
Para bentôs de sushis, as tradicionais marmitas, não tem como colocar peixes frágeis, uma vez que quem vende bentôs, tem que considerar que o cliente pode comer daqui à horas. Por isso, a variedade de peixes fica bastante restrito. Peixe branco nem pensar.
Sobram os restaurantes sofisticados. Mesmo entre os de alto padrão, dividem em dois tipos de público. Casas que japoneses mais frequentam e outras menos. Restaurantes que tem a sua maioria, os japoneses como clientes, alguns peixes ficam de fora, não sei por qual motivo. Salmão cru, não comem, pois consideram um peixe de água doce. Sacanagem!! Salmão nasce e morre em rios, mas passam quase toda a sua vida no mar. Mas fazer o que? Cavalinha e sardinha, só se tiver muito fresco. Há aqueles que não comem mesmo frescos, quando a mesa são ocupados de executivos japoneses de alta hierarquia, pois existe o preconceito com esse dois peixes. São peixes populares. Bobagem, mas fazer o que?
Robalo e Tainha, são peixes que diferente dos outros, não são tão sensíveis para a qualidade da água. Robalo por exemplo, podemos ver nadando nos canais do Porto de Santos, junto aos navios cuspindo óleo. (não que eu tenha mergulhado no canal).
Pescada, a carne quebra fácil e cheira mais quando cru. Carapau, se bastante firme. Linguado, tem que usar muito rápido, pois não dá para armazenar. Serra, é uma tristeza, quando não comprado quase vivo. Esse é o outro que fica desmanchado o tempo todo. Olhete, se firme e natural (não em cativeiro). Cavala, tem a carne muito dura o que se recomenda assar. Anchova, cheira. Por isso é melhor assado e consumido com solução de shoyu e gengibre. Enguia (Unagui) é importado e caro. Aliás os importados vem congelados e são mais caros, o que restaurantes medianos não conseguem vender.
Isso falando de restaurantes que atendem mais japoneses que ocidentais. Agora imagina quando o cliente não conhece bem? Vão pedir Torô (parte nobre do Atum), salmão, quem sabe um Pargo (meu favorito), que é um peixe cabeçudo, o que não sobra quase nada de carne. 
Tem também a questão operacional. Vamos supor que vamos limpar um salmão e um carapau. Salmão (número 2) é 10 vezes maior que um carapau. Mas na hora de limpar, o tempo é quase o mesmo. Só que um salmão rende muito mais que o outro.
Atum, já compram em peça, o que agiliza o trabalho. Quer dizer, muitos peixeiros para atrair mais o público, pegam por exemplo, a sardinha e já deixa limpo, sem escamas, vísceras, cabeça, prontinho para o uso. Daí junta o útil ao agradável e pronto.
Então há uma série de coisas que devem ser levadas em conta, antes de poder começar a variar os peixes. Podemos oferecer uma gama maior de variedades? Na teoria sim. Mas será que o público acompanha? Se eu como dono de restaurante, não importasse com o que o cliente deseja e oferecer o que eu quero, afastaria o povo que só quer salmão e atum. Teria de aumentar e bastante o preço e cobrar dos poucos que querem provar variedades.
Sushis de Ryouteis

Há muitos sushi-shokunins que fazem isso. Desde o Jun Sakamoto até o Hamatyo. Este último, o próprio dono pega o barco e vai pescar. Salmão? Nem tente pedir. No Mitsuyoshi, também. 
Mas só dá para contar nos dedos. Enquanto isso, só resta rezar para que mais pessoas ou casas, sirvam uma boa variedade de peixes. Ah e detalhe. Cada peixe tem épocas diferentes, o que muitas vezes indisponível no menu.
Para concluir, pensam que não sofro, quando tenho que vender sakes para a caipirinha? Para mim, a sakerinha é o temaki de salmão. Não estou condenando o drink, nem o sushi. Mas que mais pessoas, possam conhecer uma gama enorme de variedade para depois, quiser ficar na sakerinha, por mim, tudo bem.




22 março 2012

A-UN, O Equilíbrio




No começo dessa semana, tive a chance de trocar de ares desse caos que vivemos em São Paulo. Na verdade o caos fica dentro de mim mesmo, viciado em trabalho. Mas que eu precisava estar em lugares diferentes, mesmo que à serviço. Então tive a grata oportunidade de voar para o Rio Grande do Sul, na cidade de Gramado, especificamente para o Restaurante SAN TAO, ao lado do Lago Negro, uma das regiões valorizados da cidade, para a Confraria de Sake.
Na verdade essa idéia vem se fermentando faz muito tempo, bem antes de eu percorrer o país para falar de sakes. E até foi bom essa espera. Assim como toda boa bebida, fica bem melhor maturar por um tempo, para saborearmos em toda a sua plenitude (Ó falei bonito, hein?). Mas o assunto de hoje, não é da confraria em si.
O que mais me surpreendeu foi a visão, iniciativa e a persistência dos irmãos Rafaela e Cristiano Ribeiro. A casa tem a cozinha asiática, onde os sushis e sashimis entram. Rafaela, não é uma pessoa que corre atrás das coisas. Ela persegue uma presa com garras, seja novidades, ingredientes e profissionais. E não foram poucos. Chefs como Shin Koike (Aizomê), Tsuyoshi Murakami (Kinoshita), Anita Lo (
Com os ingredientes, a mesma coisa. Tudo que se encontra no bairro da Liberdade, tem lá. E pensar que muitos restaurantes japoneses no próprio Estado de São Paulo, não correm atrás das coisas. E como se não bastasse, itens que estamos pesquisando a tempos para trazer do exterior, ela já tinha. (claro que não vou falar o que é)
Mas não é só isso. Não sei descrever exatamente o que é ou nem sei se tem uma única palavra para isso. É uma mistura de iniciativa, sonho, explosão, não sei. Tudo isso pode também virar contra. Mas Rafaela consegue fazer isso em um bom equilíbrio. 
Fora o sorriso que parece tatuado no rosto e de uma alegria de vida, que olha!!
Mas ao perceber que Rafaela, começa a pegar impulso e subir muito alto, vem o Cristiano para trazer de volta à Terra. O irmão, atua na casa como sommeliere e coordena a equipe em relação à todas as bebidas. Futuramente estará com um novo empreendimento, mantido em sigilo, por enquanto. O relacionamento dos dois, parecem os dois guardiões de templos japoneses e chineses, onde um dos leões está com boca aberta e a outra fechada.
Com uma calma e serenidade, o generoso irmão, também tem visões e idéias, mas com um pouco mais de peso. 
Essas coisas que eu acho formidável entre irmãos, e é o meu sonho que os meus filhos pudessem ter esse tipo de parceria. Eu já não tive essa chance, pois papai e mamãe ficaram tão felizes quando eu nasci que não quiseram mais ter filhos (ah falô).
Tudo na nossa vida, tem de ter um pouco de ousadia e calma. Porém em certos momentos, um pouco mais que o outro.
Foi uma experiência fantástica que tive no San Tao, além de todo o carinho da equipe e dos convidados. Uma das melhores confrarias que certamente ficará guardado na minha memória!!

12 março 2012

Minha visão do Jun Sakamoto




Numa noite de quinta-feira, passando pela Av.Paulista, mergulho o meu carro para passar debaixo da Rua da Consolação, ao sair para a Av.Rebouças, cheguei num outro mundo. Uma chuva pesada que fez com que vários carros desacelerasse pois não dava para enxergar um palmo. Mesmo na velocidade máxima do limpador, andava com o carro na fila do velório. A faixa da esquerda, já era um rio. 

Mas tive que prosseguir e cumprir o horário. 20:00, tinha que me encontrar com Carlos Santichio e Virgínia Volp para o jantar. Mas cheguei em segurança e só não me molhei muito, pois o manobrista com o enorme guarda-sol, veio me buscar.

Na fachada elegante, quase toda de vidro, transparecia um ambiente sofisticado e charmoso. E ao entrar e hostess me recebeu com uma voz, que precisava parar o coração para escutar. Já na quina do balcão, Carlos já me aguardava.
Na parte interna, os sushi-shokinins estavam preparando o seu local de trabalho. Conversamos um pouco eu e Carlos, sobre negócios, quando com um samue azul-marinho, cabelo impecavelmente penteado, cavanhaque quase que desenhado, surge no balcão. E a reação foi de imediato, do tipo: “Por isso que está essa chuva.” (Faz tempo que não vou)

Era o Jun Sakamoto, o Shushi-chô. Da mesma forma de sempre, silencioso e calmo, já foi se posicionando para o trabalho.
Não estou aqui para contar sobre o que comi e o que achei. Mas ver o que eu enxerguei e senti do profissional, da casa e do atendimento. 

Definitivamente é um estabelecimento para os iniciados. Isso não quer dizer bons frequentadores do Jun Sakamoto, mas sim em Sushi-yás. 
Mesmo no Japão, há sushi-yás de vários estilos e classes. Desde os Kaiten-zushis (esteira levando pratos de sushis no balcão), os Edomaes, que são mais barulhentos e os sofisticados, que os clientes quase não conversam. Este último chegava perto ao do Jun.

Sempre que posso, me sento na ponta do balcão. Consigo ver a frente, a vitrine dos peixes e também, a parte interna e o manaitá (tábua de corte). 
Havia também dois rapazes que aparentava ser fornecedor de pescados, o que passaram a noite toda conversando com o shushi-shokunin. E a conversa fluía bem animada. O impressionante, é de tanta conversa, o corpo parecia centrado no trabalho. Alternando movimento suaves e firmes, realmente dava gosto de ver o seu trabalho. O modo que dobrava um pano, de tirar o wassabi fresco do pacote, e o recolocar da faca, depois do manuseio. Tudo com uma disciplina robótica, mas bem natural. 

Percebi também, que nada ia para o lixo. Mesmo a pontinha da peça de atum ou qualquer outro peixe, era jogado, como vejo em muitos lugares. E ainda, colocava-o de volta na geladeira, para depois ser recolhido.
Entre um peixe gorduroso e um menos gorduroso, lavava as mãos. A quantidade de wassabi variava pelo peixe. Sushis que saia um pouco do tradicional, era explicado com detalhes. E um dos diferenciais da casa é o shoyu pincelado, pronto para o cliente comer. Confesso que o meu corpo está pronto para pegar o sushi, molhar no shoyu e comer. Mas nada que me descontrolasse. Achei até muito mais prático. Claro que existe motivos mais fortes para esse tipo de serviço, o qual frequentemente reclamo no twitter. O piscinão de shoyu. Não pelo desperdício do molho, mas desequilibrar o sabor do conjunto.

O tratamento do menu-degustação também foi ótimo. Começou com um otoshi de molho teriyaki, que dá uma leve adoçada na boca, já que os itens a seguir são sushis, que tem um tom adocicado. Para depois de todo o circuito, vir um osuimono com ostras suavemente salgado. E para fechar, o tradicional sorbet de maçã verde com gelatina de sake.
E claro, como um consultor de sake, provei a gelatina isoladamente, o que reparei uma bebida premium.
Então, essa foi a minha visão, meu ângulo que observei o restaurante Jun Sakamoto. Claro que há muitos outros pratos que preciso conhecer e várias bebidas que preciso tomar. 

Mas para sentir realmente todo o sabor, a inspiração, o trabalho e a mensagem do Jun Sakamoto, não tomei e fiz com que meus acompanhantes a não tomar sake. Isso arrancou uma discreta aprovação do Sushi-shokunin, mais conhecido dessa cidade.

Se tiver algo que podia alterar um pouco, é a redução da seriedade dos atendentes. Não houve nenhum erro, tudo de forma impecável. Mas como sempre digo, gosto de um atendimento humano, que impecável.

O Jun? Conversei com ele um pouco antes de irmos embora. Também sou fornecedor e comerciante. Se eu não tivesse um assunto, não gosto que fique de papo comigo. Nos deu atenção na medida certa. E eu estava lá para comer e falar de negócios com os meus amigos.
É isso. E para vocês que conhecem a casa. O que acharam?



03 março 2012

A Bailarina e o Curry




À quase 9 anos atrás, quando eu e meu pai fomos ao Japão, buscar as cinzas de minha mãe, uma viagem triste mas que ficamos mais unidos, já que filho homem se apega mais a mãe, que o pai. Apesar da ocasião, a gente conversava sobre tudo. Perguntas que sempre tive vontade fazer a tempos, fiz. Ele também, esquecera um pouco da hierarquia e falamos de igual para igual. Acredite-se quiser. Nossa família mantém uma tradição antiga, onde hierarquia impera ainda nos dias de hoje. Propor idéia, é como uma grande empresa. Se não convencer, perco pontos. Confesso que é saco ter essa vida. 
Bom, numa terça feira de inverno, na cidade de Hakata, sul do país, fomos conhecer um restaurante fino e tradicionalmente japonês. Desde a sua entrada com um belo jardim, milimetricamente tratado, até a sua entrada que mais parecia vagas para dois carros.
Duas entradas. Uma para a ala de ozashikis e outra para o balcão. Não fizemos reservas, então sentamos no balcão. O Hana-ita, chef mór do estabelecimento, era muito simpático e gentil. 
Reparamos que um casal estava também de papo com o Hana-ita. E não pude evitar em ouvir a conversa, o que eles também gentilmente partilhou o assunto conosco.
- Minha filha está prestes a chegar aqui. Meu filho foi buscar no aeroporto e vem direto para cá.
- Ela mora no exterior?
- Ela está retornando depois de 3 anos. Mal acabou de se formar o colegial e partiu para Moscow para aprender balé.
- Que fantástico!! - exclamei.
A esposa só sorrisos:
- Mas ela é tem um gênio forte, que quando bota uma coisa na cabeça, não cede para ninguém. Momentos antes de embarcar, ela disse que não iria telefonar. E que era para a gente não telefonar, se não fosse um caso grave. Durante todo esse tempo, ela ma mandou apenas 3 cartas. Na verdade era um cartão de natal.
O marido.
- Puxa, foi uma tortura para nós. Minha filhinha, num país diferente, não sabe o idioma, a cultura e dá uma dessa? Porque ela não age como uma menina normal, dizendo que está com saudade e volta? - Enxugava os olhos.
Meu pai, calado até esse momento.
- Sua filha é uma jóia rara. Muito mais bela que muitas meninas a até de rapazes.
O clima estava bem familiar. Conversamos bastante, quando a porta abriu. Era um casal jovem. Um rapaz alto e uma moça linda, alta e magra. Era a própria bailarina.
Diferente do que costumamos ver no ocidente ou em filmes, onde todos pulam e se abraçam, discretamente fechou a porta do ryoutei, seguiu em direção ao pai e:
- Acabei de retornar, meu pai. - e apenas abaixou a cabeça.

Os pais, cheio de lágrimas e nós claro, em segundo plano, sorrimos e desejamos um bom retorno.

- Senhor Iida (nós), hoje pedi ao Hana-ita, o melhor cardápio que pudesse oferecer. O mais tradicional de todos os tradicionais. Imagine você longe do país natal por 3 anos, deve estar com uma saudade extrema da comida da terra. Por isso, queria dividir com você essa alegria, claro se não importar.
- De forma alguma.
E vários assistentes do Hana-ita, começaram a nos servir. Desde a entrada, belíssimos pratos que dava dó de comer, de tão bem montado. Todos com olhos e bocas cheias, mas reparei na bailarina. Embora aparentasse estar gostando, sabe quando um ângulo da sobrancelha, entrega que falta alguma coisa?
Os pais, não reparavam. E o circuito correu como combinado. O Hana-ita, depois do 3 prato disse:
- Vamos parar por aqui. Senão a moça, não conseguirá comer o verdadeiro prato que deseja.

Confesso que fiquei assustado. A comida estava excelente. Mais tradicional que isso, só voltando no tempo. Mas:
- Filha, não era isso que queria comer? Você queria comer sushi? Me fale que eu arrumo para você.
- A comida está ótima e não tenho nada para me queixar. Mas no fundo, eu queria tanto comer o KARÊ RICE (Molho Curry com Arroz) que a mamãe faz. Passei 3 anos longe do Japão. E ainda num país que mesmo no verão é frio, pensei em desistir várias vezes. Os treinos são puxados, o instrutor era rigoroso, tinha de respirar balé. Mas quando estava por fio de cabelo para voltar ao Japão, lembrava do Karê da minha mãe. Pensava comigo: “Vou aguentar aqui. Mas quando completar a jornada e voltar ao Japão, vou comer o karê de minha mãe até dizer chega.”
Sabe quando você pega o oshibori e disfarça limpando o rosto? Pois é. Eu estava fazendo isso.
O Hana-ita, entendeu de primeira e com sorriso no rosto:
- Nós que preparamos, estudamos e vivemos a gastronomia japonesa, temos um único adversário que jamais vamos superar. A comida de nossa mãe. Não há como superar, pois as nossas raízes saem dela. - Concluiu.
Só sei que por cerca de duas horas, além de saborear o que há de mais tradicional da comida japonesa, pude exercitar a minha sensibilidade, sentir o calor de uma família, lição de vida, exemplo de luta e a harmonia entre humanos, mesmo de desconhecidos.
E vocês? Já passaram por algo assim?

02 março 2012

Chawanmushi


(Foto: @bronza / Restaurante Ban)

De papo no twitter com o @bronza e a @ankauf, chef Andrea Kaufmann do AK Vila, comentávamos sobre Chawanmushi. Onde encontrar um bom? Onde encontrar um tradicional? Ou melhor, onde encontrar um restaurante japonês, que fizesse um chawanmushi? Já provei de várias (poucas) casas, mas nenhum me agradou. Até fora de São Paulo. Já cheguei a abrir a tampa, fechar e devolver. Ah, chawanmushi eu devolvo mesmo!!
Chawan, quer dizer “tigela”. Mushi, do verbo Mussu, significa “Cozido à Vapor”. O mais engraçado, foi saber o que é, quando tinha os meus 7 anos de idade. Minha mãe saindo da cozinha com 3 tigelas, pousa a bandeja em cima da mesa. E ao tirar a tampa de cerâmica, a fumaça da bomba atômica. Pergunto à minha mãe:
- Mamãe, o que é isso?
- É como um pudim...
Já cai de boca, ao ouvir pudim, uma das taras que eu tenho. Mas...
- Mas é salgado???
Minha mãe dando risada, me observa afastando a tigela. Criança nessa idade que fixa qualquer idéia ou informação, e quando contrariada, pode repudiar qualquer coisa. E Chawanmushi foi um deles.
Já grandinho e pronto para aceitar o chawanmushi, não estava em plena condição física para provar. Eu estava de cama. 
Mas quando minha entrou, já alertando que fez um Chawanmushi e que não era para eu questionar e experimentar, provei. 
Um quente bastante confortável. O forte aroma do Mitsuba, o sabor e a leveza do ovo, o peso do camarão e o frango que gosto bastante, me “abraçou”de forma, tão gostoso transformando um prato que recusava por anos, para um dos favoritos.
E sempre quando chegava o inverno ou o frio:
- Mãe, a senhora vai fazer Chawanmushi??? Ó, tá frio, hein?
E ela fazia. Em 2 tigelas, o da minha mãe e do meu pai. E na outra tigela gigantesca para servir lámen, era o meu. O certo é comer com hashi, os ingredientes e com a colher o “pudim salgado”. Eu já comia com a colher de sopa mesmo, tamanha era a minha tara.
Só que depois que minha mãe faleceu, faleceu o chawanmushi da minha casa. Não é um prato fácil de fazer. Muito menos prático. É um saco.
No Japão, o chawanmushi é o passaporte ou diploma, para ser considerado um bom Itamae (Tradicional Cozinheiro Japonês). Onde o mais difícil é o equilíbrio entre o Dashi (Caldo de Kombu e Katsuobushi) e o ovo. Sabe quando o pudim dá errado?Só que mais difícil. 
Se colocar muito dashi, o “pudim”, fica mole demais. Se for muito ovo, fica duro e racha. O dashi, se solta. Para saber se o chawanmushi está bom ou não visualmente, basta observar o limite do “pudim” e a parede interna da tigela. Tá bem grudada a ponto de fazer uma curva para cima, e pequenas bolhas, é sinal da perfeição. 
Se ver que está rachado e o caldo separando da tigela, está duro. Muito ovo.
Um dos pratos, que só com muito carinho, paciência e tempo, dá para fazer. E essa dificuldade que tenho de encontrar em restaurante, talvez seja um castigo, por não ter aproveitado o tempo que repudiava.