30 janeiro 2011

O Fácil, é o Difícil


Na gastronomia japonesa, um dos primeiros mandamentos que todos os aprendizes á Itamaes (Chef de Cozinha Japonesa), aprendem é: “O mais fácil, é o mais difíci” Ou seja, tudo que aparenta ser fácil, deve se prestar atenção ao dobro. Por que disso? Concorda que, para tarefas mais complexas, complicadas, nós nos concentramos muito mais que as tarefas mais simples? É o mesmo também na hora de dirigir. No início, chegamos a olha os pedais, para ver se está pisando certo.


Digo isso, pois observo bastante os pratos e petiscos mais simples, que muitas deixam a desejar. Os pães, patês, a manteiga e outros itens que antecedem a refeição, não são levados muito a sério. Ou são comprados. Não produzidos na casa. No Japão e principalmente no verão, são servidos os Edamames, a soja verde, que vem no talo. Muitos estabelecimentos de rede, podem servir os edamames pré-cozidos e congelados, o que definitivamente destrói o sabor da soja. Mas em lugares sérios, mesmo um simples izakaya, preferem comprar os maços fartos da soja, ainda no talo e preparar na própria cozinha. Além de muito gostoso e nutritivo, mesmo na correria, é fácil de fazer.


Primeiro, antes de lavar, corte com uma tesoura, a ponta da vagem. Ao fazer isso, na hora de cozinhar, o sal consegue temperar a soja que está dentro, deixando com mais sabor. Muita gente que não sabe disso, acabam arrancando as vagens do talo, o que deixa ainda intactas.


Segundo passo, é lavar bem e depois massageie as vagens com sal, para tirar todos os pelos. Pegue uma panela e ferva a água com bastante sal. Coloque as vagens e acompanhe o cozimento. O tempo é mais ou menos 2 minutos ou menos. Como toda a vagem, deve pegar alguns com “hashi” e verifique se já está levemente macio. (Cuidado para não se queimar).


Depois de pronto, polvilhe o sal, para manter o verde vivo. Pode tanto comer bem quente, mas espere esfriar um pouco. A combinação perfeita, é com bebida alcoólica, principalmente a cerveja. Para quem desejar tomar saquê, cai bem com uma bebida seca.


Aparentemente é fácil e sem mistério. Mas pequenos detalhes podem quebrar todo sabor. Por exemplo, é cozinhar demais. Despedaça a soja a ponto de derreter. Se cozinhar desde a água fria, deixa toda a soja amarelada. Se não adicionar o sal, pode deixa a vagem dura demais, além de não realçar o sabor da soja. Se não cortasse a ponta da vagem com a tesoura, o sal, não tempera as sementes direito.


Então, mesmo que seja uma tarefa ridiculamente fácil, devemos prestar muita atenção. O perigo mora aí!!




Outras informações sobre o Edamame: A “Soja no Talo”, é consumida no Japão, desde a Era Heian (794 à 1192), e muitas lojas cozinhavam e temperavam pequenos maços, com talo e tudo, para que as pessoas, pudessem beliscar andando pelas ruas. Por causa disso, Edamame, quer dizer “Soja no Galho”. Aqui no Brasil, já é plantado em várias regiões do Brasil, e em São Paulo, principalmente em Mogi das Cruzes, oferece sojas frescas, entre o mês de janeiro à abril.

29 janeiro 2011

O Verdadeiro Conceito


Esse episódio aconteceu e um tradicional restaurante de Kyoto, onde se atende apenas 34 clientes por noite. Por isso, é uma fila na reserva. Uma boa e cara comida, mas justificável, por servir excelentes ingredientes e uma ótima mão-de-obra. Vale cada centavo gasto. Mas como em qualquer estabelecimento gastronômico, tem épocas que todo o trabalho cai na rotina. Com tantos clientes de diversos pontos do país e do exterior, a correria por toda a casa, faz com que muitos esqueçam o principal ingrediente: O Conceito.


Não digo conceito como releitura de pratos ou modismo. Mas o real valor de todo um trabalho, preservado por décadas.


Num belo dia, um senhor com a sua bengala, se acomoda sozinho em um “ozashiki”, sala vip de tatame, que cabe 4 pessoas. E pede para trazer, o que há de melhor no dia, o Menu Degustação ou chamado em japonês de Kaiseki Ryôuri. Aparentemente, não tem cara de rico ou um gourmet. E ainda por cima, pede para a proprietária comparecer ao ozashiki e solta:


“Se eu não ficar satisfeito, eu não pago!”


Prontamente, aquela senhora tão rígida e tão brava, aceitou a proposta. E mesmo após o início do serviço, ela ficou sentada próximo ao cliente, fazendo companhia para os 9 pratos que chegavam pausadamente. Após encerrar com um bom chá verde, ele diz: “Não vou pagar!” E a dona, aceitou, de olhos fechados. Não fez cara feia, não fez escândalo, o contrário do pessoal da cozinha. Enfurecidos, queriam saber através na “Nakai – garçonete de kimono”, o porque da insatisfação. Mas sabia que o cliente, não havia dito.


Na semana seguinte, aparece o mesmo senhor, e quando todos da cozinha souberam da presença dele, ficaram alerta. Chegaram a trocar vários itens do menu, oferecendo o melhor dos melhores ingredientes. A melhor parte, a melhor peça, a parte mais fresca. A proprietária o acompanhou pacientemente, enquanto o velhote, magrinho que só, devorava todos os 9 pratos. E mais uma vez: “Não vou pagar!”. Essa altura, alguns da cozinha, já queriam chamar a polícia, quando o Tateita (Sub Chef) reuniu todo mundo:


- Temos que bolar um plano. Não é possível, que aquele “velho”, não tenha gostado de nenhum dos pratos. Talvez, a forma de apresentar. Pode ser a quantidade. O sabor pode estar forte demais.


Realmente todos estavam participando, independente da sua posição ou tarefa. As garçonetes, tentavam achar, onde estava o defeito nos pratos. Também recobraram nas próprias posturas ao entrar na sala. Todos estavam com os nervos a flor da pele. E mais uma noite, o velho: “Não vou pagar!!” Talvez o cliente tenha dito alguma coisa à dona. Mas ela se reservou a guardar como segredo.


Na noite seguinte, já sem esperanças para agradar aquele filho da mãe, o Hanaita (máster chef) olhou para todos: “Vamos fazer uma comida gostosa. Vamos caprichar, mas dentro do que é o nosso estilo. Não vamos esquecer de nenhum item. Vamos jogar todo o nosso sentimento na comida. Quem sabe, a gente não transmite a nossa mensagem?” E lá foram todos, empenhado dando o melhor de si.


Começou novamente a degustação e o velho, sem alterar a sua fisionomia. Comeu tudo, tomou o chá verde, abriu o seu paletó e tirou um envelope recheado de notas de 10.000,00 ienes. Deixou em cima da mesa e pediu a dona, que o recolhesse.


- Não posso aceitar. Desejo que o senhor guarde o envelope, pois nos proporcionou uma coisa tão valiosa, que o dinheiro não compra. A união de todos nessa casa. Fazia tempo que não via aquela cozinha tão unida. Todos batendo a cabeça, empurrando ou puxando, quando na verdade, era só manter o nosso estilo. E também prefiro não contar a eles, que o senhor finalmente aprovou o prato. Assim, nunca vão esquecer.”




03 janeiro 2011

Engano

De uns tempos para cá, um assunto vem me irritando. A Avaliação Anual de Sakes, realizado em diversos pontos do Japão. Lá são fabricantes de todos os cantos do país, que trazem as suas preciosidades, para confrontar os seus saquês com os outros produtores. Não é uma competição, para eleger “o melhor”.

A Avaliação, é definida em duas etapas. A primeira parte, é a geral, onde todos os produtores inscritos, expõem as suas bebidas, o que pode chegar a 1000 rótulos. Cada um tem o seu copo e próximo das garrafas, ampolas onde o examinador suga e despeja no seu copo e avalia. Como são muitos, deverá cuspir em um recipiente para isso. Em uma prancheta, é preenchido um formulário, onde existem campos sobre a análise visual, olfativa, gustativa e finalização.

Ao final, “sobem” para a próxima etapa, os produtores que conquistaram boas notas. E os que ficaram, podem levar um prêmio de consolação, o chamado “Nyûshou” ou “Indicado”. No dia seguinte, vão os finalistas. Novamente todo o ritual de degustação e os melhores ficam com o “Kinshô” ou “Medalha de Ouro”. Alguns podem merecer o “Guinshô” ou “Medalha de Prata”. Os produtores e a fabrica, são nomeados e diplomados no final do evento. Uma honra e felicidade para a marca, e festa ao retornarem para a cidade. O diploma é exposto em um lugar especial da fabrica.

E fora isso, tem os eventos como o Monde Selection e o Internacional Wine Challenge, onde os fabricantes se inscrevem os seus saquês. Quando conquistam os prêmios, chegam a mudar o rótulo e o estojo da bebida, estampando a conquista sem nenhuma discrição.

Até aí tudo bem. É um momento onde o produtor é avaliado, e se ele conquista a melhor posição, ótimo para ele. Entenderam? “Para ele”!!

Agora muitos não sabem, é que os saquês inscritos, são lotes especiais para a Avaliação, onde o consumidor não tem acesso para a compra. Então surge a questão. O que realmente o consumidor está bebendo? Quando se expõem que “aquele” saquê ganhou o prêmio, não é aquele exatamente, certo? Correto!! Então é uma enganação e uma politicagem que acontece. O que o consumidor acha, não é considerado. E quem são os avaliadores? Produtores? Claro que vão afirmar que o “seu” é o melhor.

A mesma coisa acontece em outros ramos da nossa vida. Um filme vencedor de várias estatuetas, não necessariamente, o público irá apreciar. Chefs e restaurantes premiados, nem sempre são bons. Estilistas, maquiadores, arquitetos, enfim, todos deveriam ser avaliados pelos resultados e não só pelo profissional.

A minha conclusão é: Os prêmios, pouco me importa. Prefiro saber, o que os consumidores no mundo gostam.